O ex-chanceler Ernesto Araújo poderá ser um dos indiciados pela CPI da Pandemia por sua gestão do Itamaraty em meio à crise sanitária e por usar a rede diplomática brasileira como instrumento num esquema que teria contribuído para o número de mortos no país pela covid-19.
Sem foro privilegiado por não ser mais ministro, Araújo poderá ser citado em supostas infrações sanitárias, além de charlatanismo e estímulo à propagação da doença. Uma decisão final sobre a inclusão de seu nome deve ser tomada nas próximas horas ou dias.
O debate sobre a inclusão de Araújo ocorre num momento de divergências entre o relator da CPI da Covid, Renan Calheiros (MDB-AL), e o presidente do colegiado, Omar Aziz (PSD-AM). O racha colocou dúvidas em relação às sugestões de indiciamento que serão enviadas ao Ministério Público ao fim dos trabalhos.
O atrito eclodiu depois que, no fim de semana, vazamentos de trechos do relatório chegaram à imprensa, antes que parlamentares da oposição e independentes críticos ao governo pudessem debater pontos nos quais há dissenso. O vazamento provocou uma reviravolta na agenda e o adiamento da leitura e da votação do documento.
Ainda assim, fontes em Brasília que participaram da elaboração do relatório da CPI confirmaram à coluna que existem pelo menos dois motivos para uma possível inclusão de Araújo na lista de acusados.
Um deles seria a decisão inicial do ex-chanceler de não aderir ao plano da OMS (Organização Mundial da Saúde) de criação de um mecanismo de distribuição de vacinas, a Covax.
Instruções enviadas pelo ex-chefe do Itamaraty aos postos pelo mundo ainda deixavam claro que existia uma ofensiva contra o que Araújo chama de "globalismo". Até mesmo os termos usados pelos diplomatas brasileiros foram modificados para tratar de temas internacionais.
Quando o Brasil optou por finalmente fazer parte da iniciativa de vacinas, a decisão do governo foi por comprar o menor número de doses oferecidas pelo mecanismo. Pela proposta oferecida pela Covax, o Brasil poderia ter adquirido 86 milhões de doses. Mas escolheu reservar apenas 43 milhões.
Outro fator que deve pesar é o uso do Instituto Rio Branco e a Fundação Alexandre de Gusmão - entidades sob o comando do Itamaraty - para promover a difusão desinformação sobre a pandemia. Por meses, as entidades organizaram seminários com expoentes do negacionismo e Araújo é considerado como a pessoa que chancelou a operação.
Nesses eventos, o uso da máscara, o confinamento e outras medidas foram questionadas como elementos que poderia limitar as liberdades individuais. Não faltaram ainda dúvidas sobre as recomendações da OMS, minando a credibilidade das orientações científicas.
Araújo, depois de ser derrubado do cargo de chanceler, pediu uma licença remunerada de três meses. Quando esse período acabou, o ex-ministro obteve uma licença de um ano, desta vez sem remuneração. Dentro do Itamaraty, a suspeita é de que ele esteja planejando se lançar como candidato nas eleições para o Congresso, em 2022.
(Do UOL)
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