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O que você faz quando quer, de qualquer jeito, comprar o look que uma blogueira postou nas redes sociais? Tem duas opções. Pode ir até a loja experimentar a roupa e sair feliz com a sacola ou comprar online e esperar chegar em casa sem grandes frustrações. Parece fácil e óbvio, mas acredite: para grande parcela da população, nenhuma dessas opções é possível pelo simples motivo de essas pessoas não encontrarem nada para o corpo delas.
“A maior dificuldade é o meu tamanho. Tenho 35 anos e 1 metro de altura. Geralmente, vou ao setor infantil da loja, mas ali não acho peças para trabalhar ou passear nem que combinem com a minha personalidade e com a imagem que quero passar”, revela Heloísa Rocha, jornalista sergipana radicada em São Paulo. Ela nasceu com osteogênese imperfeita, condição rara de fragilidade óssea. Neta e sobrinha de costureiras, cresceu em meio às máquinas e, desde pequena, é apaixonada por moda. Aprendeu tudo sobre seu corpo e como valorizá-lo, desenvolveu estilo próprio.
Já adulta e formada, cobriu edições da São Paulo Fashion Week, onde chamava a atenção dos participantes do evento. “Percebi que dentro daquele universo que gostava de se mostrar tão perfeito eu era a imperfeição. Mesmo estando ali a trabalho e com a imprensa, eu destoava”, lembra. Entre as amigas, porém, Helô era um sucesso. Elas pediam dicas para se vestir para um encontro romântico ou entrevista de emprego.
Isso se tornou tão comum que, em 2015, a jornalista teve a ideia de criar o Moda em Rodas (@modaemrodas), página que começou no Facebook e migrou para o Instagram. Hoje, já são mais de 5 mil seguidores – mulheres que andam em cadeira de rodas, com nanismo e plus size são a maioria. Helô compartilha dicas de looks, comenta eventos de moda que frequenta e faz posts para conscientizar seu público sobre os desafios das pessoas com deficiência (PCD). “Quero tirar um pouco o foco da palavra inclusão e falar em diversidade. O mundo é heterogêneo, a gente tem que aprender a aceitar as pessoas com corpo e personalidade diferentes”, defende.
Helô alerta para algumas mudanças essenciais e nem tão complicadas, como o treinamento de vendedores e atendentes nas lojas. “Nem eles nem os empresários, donos dos negócios, estão prontos para receber pessoas com deficiência. Não sabem lidar, ficam com receio, constrangidos. Acontece muitas vezes de o vendedor se dirigir ao meu acompanhante, e não a mim, fazendo com que eu me sinta infantilizada”, conta.
Desejando promover mudanças, Helô abastece seus canais de comunicação e, recentemente, lançou até um podcast semanal com o tema. “Ele é curto, mas didático”, garante. A primeira convidada foi a paulista Michele Simões, designer de moda e criadora do projeto Meu Corpo É Real. Em 2005, logo após se formar, ela sofreu um acidente e, desde então, usa cadeira de rodas. “Na época, travei uma batalha para entender o meu corpo e como poderia aproveitar tudo o que eu tinha aprendido na faculdade. Afinal, durante os estudos de moda, nunca tínhamos falado de pessoas com deficiência. Essa desconstrução foi acontecendo lentamente, porque não existe referência. Você não vê exemplos em revistas nem na televisão. Não tem um histórico de referências positivas para se espelhar”, afirma.
Em 2015, ao visitar uma exposição no Canadá, Michele percebeu que era possível quebrar estereótipos fazendo moda inclusiva com funcionalidade sem perder em personalidade e estilo. Desde então, com seu projeto, leva informação a universidades, realiza ações educativas em empresas e troca de experiências em workshops.
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A paulista também é responsável pelo Fashion Day Inclusivo, evento que promove desfiles com pessoas com deficiência como modelos, usando looks criados por estudantes de moda. Já está na sexta edição. “É uma dinâmica de inclusão da qual participam pessoas com e sem deficiência. Chamamos profissionais que nunca tiveram nenhum contato com PCD na moda para trabalhar na ocasião. E todo mundo sai dali bem informado.” No Instagram @meucorpoereal, Michele ainda quebra o tabu sobre o tema escrevendo posts com linguagem pop, descontraídos. “Além de criar sensação de pertencimento, isso estimula as pessoas com deficiência a olhar para si mesmas, a realmente se perceber.”
Tanto Heloísa quanto Michele defendem que, para essas pessoas serem vistas, devem poder contar suas histórias – e precisam ser ouvidas. O longo período de invisibilização precisa acabar. Partindo desse pressuposto, a paulista Daniela Auler coordenou por 12 anos o projeto de moda inclusiva da Secretaria de Estado de Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo. Ela foi também a idealizadora do concurso Moda Inclusiva, que premiava os melhores trabalhos de alunos do Brasil para pessoas com deficiência.
Daniela deixou a secretaria em 2018, mas continua atuando no segmento como consultora de moda inclusiva para instituições de reabilitação e universidades. Uma das ações que ela encabeça hoje é o Retalhos e Atalhos, em que leva a técnica de upcycling a pacientes internados em hospitais. “A ideia é que cada um resgate uma roupa que não consegue usar mais por causa de suas novas limitações. Fazemos todas as adaptações necessárias, cortes, adicionamos zíperes… Facilitamos o uso e, assim, impedimos que as pessoas percam peças que adoram”, explica Daniela.
Iniciativas como essas são imprescindíveis para que as pessoas com deficiência resgatem sua autoestima e mostrem que também são consumidoras – o mercado para esse público é gigante. “No Brasil somos 45,6 milhões de pessoas com deficiência”, diz Heloisa. A moda é um fenômeno cultural de cada tempo e já passou da hora de a produção atual refletir as várias possibilidades e a personalidade das mulheres.
(msn)
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